dos gritos e a maldade dos homens

No começo, eu era uma menina que queria sentir
Como era ser mulher
A mulher dos finais felizes
A mulher dos gemidos altos
A mulher que seduz
No espelho, não havia muito amor
Meus olhos estavam sedentos do mundo e eu
De amor
O primeiro menino que me desprezou era quatro anos mais velho que eu.
Eu tinha doze, ele dezesseis,
E eu queria que ele me admirasse, mas ele tinha outros planos.
Olho pra traz e penso na doçura dos primeiros corações partidos.
O segundo, era um menino de Deus - se o Diabo existe, ele usava pessoas como ele (e eu não digo num bom sentido)
O terceiro disse que iria me ensinar a ser mulher
Ele gostava do meu corpo e eu gostava das coisas que ele falava
Ele tirou minha virgindade, mas minha inocência permaneceu
E daí veio o quarto menino, e ele me amava. Ele dizia que me amava. Ele me encarcerou.
Eu descobri que os meninos gostavam se você gritava seus nomes e gemia como um felino,
E eles gostavam da boca, da saliva e do cabelo
Os meninos gostavam da violência, não só do sexo.
O quarto menino quis levar a violência pra fora do quarto e tentou arrancar a maquiagem do meu rosto.
O quarto menino foi embora e eu tenho certeza que até hoje ele me chama de puta. E até hoje eu agradeço por estar viva, porque o quarto menino queria que eu fosse dona de casa e não tivesse amigos homens, e cá entre nós, esse tipo de menino sempre termina em ordens restritivas e  feminicídio.
Depois do quarto menino, veio a faculdade, e minha inocência começou a se esvair quando eu percebia que as promessas só duravam enquanto minhas roupas estavam no corpo.
E aí veio o quinto menino. E ele levou minha inocência embora.
Quando as pessoas falam de sexo, frequentemente elas usam a palavra "comer". O quinto menino gostava de me comer, sim. Mas seu prazer maior era de me devorar.
Aos poucos, ele devorou as partes de mim que começaram a se olhar no espelho com amor. Ele devorou as manhãs da faculdade que eu perdi e ele devorou a fé de que eu podia ser amada. E porque eu queria que o quinto menino me amasse, eu gritava seu nome enquanto ele me devorava, mas ele sentia prazer e eu sentia dor.
Eu achei que não fosse sobreviver ao quinto menino.
Ele arranhou meu corpo e eu tenho marcas de suas garras em meu abdome, e tenho o peso de suas mãos em meu corpo e tenho o silêncio de seu túmulo em meus ouvidos e tenho o calor das minhas lágrimas que nunca secaram, porque ele nunca me devolveu a mim mesma, não.

O quinto menino me entregou a tantos outros meninos, e até a algumas meninas, e alguns até me amaram, mas eu já estava devorada e leva tanto tempo pra lamber aquelas feridas.
Hoje eu sou devorada, mas as feridas se fecharam. Eu ainda me quero de volta.
Encontrei um homem no meio do caminho e nos casamos. Ele passa horas preocupado com meu prazer e eu não grito seu nome ou solto gemidos de felinos. Ele beija todas as minhas partes devoradas e ele acaricia as marcas das garras em minha barriga, com tanto amor que me constrange. E eu sinto as lágrimas escorrerem. Eu choro. Eu sinto a onda de prazer percorrer meu corpo e ele arfa e diz que me ama. Eu choro de amor. Eu choro porque lamento.
Eu sinto muito que ele seja também um menino.

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