Cartas para Júlia - Pt. I

No seu aniversário de cinco anos, você ganhou uma motocicleta rosa de brinquedo. Quando tentou abrir a caixa, no seu ímpeto desajeitado de menina eufórica, acertou seu próprio rosto com o papelão pontudo e duro. Você se aproximou de mim com seus olhos de cílios imensos e me perguntou se estava sangrando. Meu amor, você só descobriu o que era sangrar quando seu dente caiu, uma semana antes. E desde aquele dia, sempre que você sentia dor, perguntava se estava sangrando.
Queria ter uma maneira doce de te dizer que nem tudo que dói, sangra. Que nem tudo que aflige dá pra curar com band-aid. Que poucos dias antes do seu aniversário, quando disseram pra você que a vovó tinha ido pro céu e você correu na minha direção e sorriu, dizendo que ela tinha virado estrela, eu doí tanto e desabei de chorar nos seus ombrinhos porque essa é uma das dores que dói sem sangrar, e por isso dói pra sempre.
No seu aniversário de cinco anos, eu quis te dar o mundo. Quis te dar tudo de maravilhoso. Tive tanto medo do que você ainda vai sofrer que quis te vestir com a minha pele. Quis te absorver e te proteger com minha carne.
Amor, não vou conseguir te explicar todas as coisas. Talvez não consiga te explicar coisa alguma. Quando seus olhos marrons me fitam com tanta admiração, eu me sinto forte. Você me faz dançar com os pés machucados só pra te ver sorrir. E você me abraça e diz que me ama. Que quando crescer, quer ser bailarina. Não, não... "bal-larina", como você realmente fala.
Minha Maria Júlia, levo flores pra acalmar seu sono e te digo que você é bonita do jeito que é. Espero que você se aceite e viva bem, porque você é a poesia e a meninice que vive em mim. Você é um bálsamo pro meu coração.
Minha menina, você é a melhor versão de mim. Você é o que me mantém. Você é o bem personificado -- a proteção da minha alma.

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