Crônicas sobre mim - Es(passos)

I) São dois passos pra fora de um apartamento
O rosto desviado
E meu relógio marcando oito da manhã
Chove pesado, meu estômago dói, eu acendo um cigarro
Me escorraço para a rua
Me esculhambo pelas calçadas, derramando café nos meus dedos,
Soltando fumaça e destilando rancor
Daquele antigo que eu tinha prometido nunca mais destilar
Mas como boa viciada, retorno me prometendo que um dia vou parar
Eu entro no metrô, eu pego chuva
Eu entro no táxi, eu chego em casa
Eu me enrolo sozinha em um cobertor
Sentindo o cheiro delicioso do meu próprio perfume
Sentindo o gosto do meu próprio amargor
Sentindo o desprazer da minha própria solidão
Sentindo a vaidade no prazer da minha companhia
Sem aqueles gritos desnecessários
Sem a falta de obrigação alheia de fazer qualquer coisa por mim
Sem planejamentos, sem horários pro jantar
Sem aquela falação intrigada e tediosa
Sem grandes dúvidas, sem lágrimas pesadas
Só o meu cheiro, meu silêncio e meu rancor.


II) Expulsa de um pedaço favorito do mundo,
volto pra dentro de mim.
Reconstruo meus muros tão frágeis e não tão altos
Colo um par de tijolos e prometo que amanhã vai ficar melhor
Admito a mudança, me revolto contra minhas ideias
E o sono puro e sem calmantes me atinge como uma onda violenta.
Eu adormeço exausta,
Ouvindo essa detestável voz interna
"Eu preciso de espaço".

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